Reprimindo e segregando



Neste exato momento está sendo votado na Câmara dos Deputados do Uruguai o projeto de lei sobre a legalização da maconha. O texto prevê que o usuário, devidamente cadastrado, possa comprar até 40 gramas por mês ou, caso deseje, cultive a planta – limite estipulado em até seis pés por residência. Além disso, sua produção para fins científicos e medicinais será permitida. E, não, ela não poderá ser usada em qualquer lugar ou circunstância: fumar um baseado em espaços públicos fechados e/ou dirigir sob seu efeito não será permitido. É vetada, também, sua publicidade.  

Enquanto isso, no Brasil, o cenário é outro. 

Foto: Eliária Andrade/Agência O Globo
Em maio deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto de lei de autoria do deputado do PMDB, Osmar Terra. Nele, está prevista a internação compulsória de dependentes químicos, caso autorizada por seus familiares, e que pode ser realizada somente pelos estabelecimentos que prestem atendimento de saúde. Além disso, aumenta de cinco para oito anos a pena mínima para tráfico de drogas, mas não delimita a quantidade da substância. Portanto, não diferencia usuário de traficante. 

Mas, então, quem diferencia?

Sabemos que as desigualdades sociais governam o Brasil de forma brutal. Desigualdades que não desaparecem só porque um trabalhador pode desfrutar de uma TV LCD (dividida em dezenas ou até mesmo centenas de parcelas), coisa que era impossível de acontecer décadas atrás. Somente o acesso a bens materiais não garante igualdade social. 

Essas desigualdades persistem, entre muitos motivos, porque há pessoas que assim querem que aconteça. E essas pessoas estão, em sua maioria, no poder. A ausência de igualdade permite que essas (poucas) pessoas continuem a desfrutar de sua boa vida e de seus bons lucros e regalias. Como já observou Marx e tantos outros pensadores sensatos, é necessário que exista o pobre para que exista o rico.

É justamente nesta questão que se encontra a resposta da pergunta acima. 

A diferenciação é baseada nas próprias condições sociais do usuário de drogas. Desde sempre a militarização das polícias brasileiras foi e continua sendo causadora do genocídio que impera as favelas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou de qualquer outro estado. Favelas, estas, que causam medo e repúdio na classe média – composta por um número grande de leitores da revista Veja -, sentimento que a torna por vezes condizente com o desaparecimento dos muitos Amarildos que acontecem todos os dias no Brasil.
  
O fato é que um usuário de maconha, ou de qualquer outra substância, negro e morador do Capão Redondo, se flagrado pela polícia com uma quantidade X da droga, tem chances de ser enquadrado como traficante e não o contrário. Em contrapartida, o indivíduo branco e residente em Perdizes, com a mesma quantidade do usuário do Capão, é definitivamente uma “vítima” das drogas e precisa de acompanhamento médico e psiquiátrico. 

Foto: Divulgação PM

É por estes e outros tantos motivos que se faz necessária uma mudança drástica na política brasileira sobre drogas. Diversos países do mundo, percebendo a ineficácia da repressão às drogas, já mudaram o modo de pensar o assunto. Até mesmo os Estados Unidos, símbolo da “guerra contra as drogas” declarada por seu ex-presidente Richard Nixon, percebeu a ineficácia deste sistema: Washington e Colorado legalizaram em 2012 o uso recreativo da maconha. 

Ainda há muito que se ajeitar em relação ao Brasil, apesar da discussão amplificada do assunto por diversos setores da sociedade. É preciso entender que a repressão às drogas não surte mais efeito, se é que um dia teve algum. Ela serve apenas para segregar ainda mais o país. 

Um comentário:

Noiva Cadáver disse...

E viva Mojica.
Tô com uma saudades de ti garoto amarelo.