Zombio, de Petter Baiestorf (1999)


O cinema possui diversas vertentes, e uma delas é conhecida por diversas denominações, tais como: cinema B, cinema thrash, cinema marginal, cinema de garagem, e etc. Essa vertente se destaca por desenvolver seus trabalhos com paupérrimo ou nulo orçamento, o que faz com que eles possuam características bastante específicas em relação ao cinema hollywoodiano, por exemplo. Câmeras tremidas, atuações forçadas, maquiagem precária e distribuição complicada são apenas uma das marcas que estruturam o cinema B.
Aqui no Brasil, o cinema marginal ganhou seu espaço através de produções feitas por nomes como de José Mojica Marins, Chico Cavalcante, Carlos Reichenbach, entre outros. Foram eles que possibilitaram enriquecer a cultura brasileira com as chanchadas, pornochanchadas e outras produções exploitation. Em relação aos filmes de terror, o nosso país possui grandes representantes que – muitas vezes ou quase sempre – não possuem seus trabalhos devidamente reconhecidos.


Uma das figuras que tomei conhecimento, e que continuam alimentando o cinema B com trabalhos corajosos, é Petter Baiestorf. O catarinense começou a gravar suas películas no início dos anos 90, onde começou a ser reconhecido pelo mundo. É em 1999 que filma “Zombio”, trabalho que discutirei logo a seguir.


(Cuidado, tem SPOILERS)


Aparentemente, o enredo surge bastante escasso de criatividade. É no decorrer dos pouco mais de 40 minutos que a história começa a ter – ainda que um pouco – certo sentido que torna a ser perdido nos minutos finais. A história tem por si um casal, Euclides (Coffin Souza) e sua namorada (Denise V), que decidem passar um fim de semana numa “ilha deserta” (o que é, na verdade, um rio cujas margens dão certa impressão de oásis), e para isso devem alugar um barco, que é conseguido por Gaúcho (Jorge Timm), um glutão que gosta de se divertir com a desgraça alheia, fato confirmado quando a mulher escorrega à beira do rio e cai de bunda no chão.

Ela reclama do frio, mas decide nadar, mas antes troca carícias eróticas com seu namorado, com direito a mostrar os seios e deixá-lo muito louco. Nadam, então, e depois Euclides busca cerveja para ambos. A partir daí, mais duas histórias surgem e fazem com que o sentido de tudo seja perdido. Primeiramente, uma estranha bruxa (Rose de Andrade) trajando curtíssimo vestido e capa a là Zé do Caixão, brota das entranhas da floresta e com sua magia levanta os mortos. Uma das melhores cenas é quando os zumbis se erguem da terra, lembrando Zombie 2, do mestre italiano Lucio Fulci. Seria uma referência – que apenas nós, fãs dos filmes de terror pastelão – no qual Baiestorf se utilizou para homenagear o diretor? Este questionamento é respondido no final de Zombio.

Logo depois, um aparente homem (Coffin Souza, em seu segundo papel no filme) vestido de velhinha (com vestido, lenço e tudo o mais), carrega nas costas uma mulher loira (Cláudia de Sordi). À princípio, o espectador não entende o que cargas d’água aquele marmanjo está vestido de mulher e porque seqüestrou aquela pessoa. Teria ele tara por roupas femininas? Estaria ele se disfarçando? Bom, Petter não responde a esta pergunta, deixando brecha para nossa imaginação.

Um ponto a se apresentado é como Baiestorf cria uma própria característica para a mordida de seus zumbis: quando Euclides é mordido, o rapaz comenta com a namorada que está “alucinado”, chegando até a dizer “Parece que cheirei coca!”. O personagem tem uma reação bastante diferente do que é apresentado em outros filmes de zumbi, como por exemplo, convulsões e hemorragia. A mordida do zumbi é como uma droga que vicia tanto Euclides, a ponto de deixar-se morder outra vez, apenas dar continuidade àquela sua “alucinação”.

O enredo se desenrola e alguns pontos, até mesmo conturbados, são esclarecidos. Descobrimos, por exemplo, que o psicótico vestido de velhinha nada mais quer do que brincar sexualmente com a mulher loira, que acaba escapando e tem fim trágico não nas mãos dos mortos, mas sim nas dos vivos.


Com um final interrogatório e niilista, com direito a bruxa se transformando numa espécie de criatura alienígena que parte para lugar desconhecido de mãos dadas com o agora zumbificado Euclides, Zombio nos diz muito mais do que procuramos saber: não precisa ter sentido, apenas FAÇA. Zombio é a coragem de dar continuidade ao cinema de horror, que é tão esquecido em nosso país pouco culto e mergulhado em gostos americanos.

Esse trabalho de Petter Baiestorf é, sem sombra de dúvidas, bastante caseiro, principalmente para aquelas pessoas acostumadas com remakes americanizados. Porém, a fotografia é bastante explorada, e a câmera esbanja ângulos criativos, muitas vezes até belos. A trilha sonora, composta por rock n’ roll da pesada, é um prato cheio para quem gosta de música barulhenta, ótima combinação para filmes gore, como os de Fulci. E, falando nele... Petter dedicou Zombio ao cineasta italiano, que havia falecido alguns anos antes, em 1996. E, nada melhorar para homenageá-lo do que um filme de zumbis, não é mesmo?





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