A morte, a melancolia e outros demônios

A morte é o fim das ilusões e priva a vida de qualquer tipo de sentimento. A morte gera o luto, e ele significa o desapego de todo o mundo para que possamos, novamente, nos apegar – o mundo torna-se desertificado diante do luto, enquanto que a melancolia tem como representação da desertificação o eu, sendo que também pode ser caracterizada pela impossibilidade de realização do objeto que se deseja. O objeto desejado faz com que sobrevivamos psiquicamente, porque nos apegamos a ele. Voltemos à melancolia: ela é a impossibilidade de desapego com a perda. Assim sendo, inicia-se a desilusão, que nada mais é do que a perca de uma ilusão – uma pequena pausa aqui para a explicação desta palavra: “ilusão”, derivada do latim ludus que significa lúdico/diversão. A partir desta informação, podemos levar a crer que uma das características fundamentais da natureza humana se encontra no fato de suas ilusões serem criadas a partir de uma ideia de entretenimento, a ilusão, sendo o signo de desejo.
Os gregos conviviam com a morte, harmoniosamente. Os pedaços de terra destinados ao plantio tinham um espaço onde eram enterrados os antepassados daquela família, onde se acreditava trazer sorte e prosperidade para a colheita. Esta ideia é confirmada, também, pelos diversos ritos do paganismo grego, direcionados exclusivamente ao culto aos mortos, mais propriamente aos antepassados e entes queridos. A convivência com a morte se torna assim, simplesmente, insuportável quando o homem pisa na Idade Média, dominada por homens de batina, que tinham o prazer de ver queimadas vivas pessoas que iam contra éticas pré-estabelecidas. A morte era vista como uma sombra, uma espécie de maldição no qual o homem era obrigado a sempre carregar consigo. Cria-se, a partir daí, a essência da superstição, que nada mais é do que uma religião privada, individual e íntima, enquanto a religião, propriamente dita, é uma superstição pública, coletiva.
A sociedade contemporânea vive em um não-conhecimento para poder saber o objeto que traz felicidade; este mesmo mundo contemporâneo tenta lidar com o tédio, com um mundo desencantado. Já não há a presença de qualquer deus – a perda da transcendência. Somos homens rasos, e não sabemos lidar com o tempo. As angústias fazem com que um indivíduo se refugie em algo que o mesmo encare como maior do que si mesmo, utilizando aqui como exemplo, a religião. A proliferação do mercado religioso vem cada vez mais crescendo, um sinal concreto de como nossa sociedade vive angustiada. Já não se consegue mais viver no presente, pois estar fora do presente antecipa o medo da morte. Busca-se um sentido para a vida. E por que é que a vida precisa de um sentido? A liberdade dá sentido à vida, no qual, sem si, não tem sentido algum.
Epicuro, com sua filosofia baseada na busca pelo prazer e felicidade na vida privada, já dizia que os homens são infelizes, pois possuem medo. É difícil se dar conta de que somos autores e protagonistas do nosso destino. E já que a tomada da consciência é trágica, a felicidade se torna inalcançável porque a razão modera as paixões, ajudando em sua procura. Portanto, se a racionalidade é o fio condutor que conduz o ser humano em direção à felicidade, o que seria o sentimento?

Um comentário:

Julia Neiva disse...

Concordo quando diz que a religião é buscada quando se tem angústia - e de fato isso acontece. Só se busca algo quando nossa vida não está indo bem, ou quando não conseguimos perceber o quanto temos dentro de nós mesmos, procurando propósitos e respostas em "seres superiores", que nos "julgarão", que nos "amam" incondicionalmente. Minha maior angústia vem quando busco esse tal "sentido" para a vida, mas isso nunca me ajudou em nada. Parei de procurar, mas sei que esse sentido virá aos poucos, conforme o tempo passar, e será apenas regado a lembranças boas e sentimentos não tão bons assim, algumas vezes. Já não sei se usar a razão e me privar de algumas coisas me fará tão bem. Isso retarda a felicidade, ou alegria somente. Mas me jogar de cabeça ainda é uma tarefa muito sábia e pouco praticável.